"Brianne"
Capítulo 59 - Regresso Inesperado
"Vais adormecer", alertou uma voz sábia na minha mente.
"Oh... Deixa lá", respondeu outra, "Também não ias decorar isto e não!"
Estava ciente que a minha cabeça estava tombada de modo desconfortável sobre o meu peito, e que os meus dedos, que anteriormente seguravam firmemente o maço de fotocópias, estavam a afrouxar. Em breve as folhas cairiam e espelhar-se-iam pelo chão do quarto.
Sabia também, que deveria forçar os meus olhos a abrirem-se, mas o peso que estes ostentavam era maior que o peso da minha determinação.
Tinha consciência de que tinha de acordar, ou então teria grandes problemas na manhã seguinte, ou para ser mais exacta, dali a umas horas, e que dificilmente conseguiria responder às perguntas do teste.
Porém, e mesmo sabendo todas estas coisas, permaneci de olhos fechados.
Era ali, no escuro, na precisão e clareza das minhas lembranças e sonhos que nos encontrávamos. Era ali, bem por de trás das minhas pálpebras que via Seth, e era feliz ao seu lado.
Sentia-o, podia tocar-lhe. Era ele. A minha memória tinha sido bastante generosa nos dias que estivéramos juntos. Era capaz de reproduzir com todos os pormenores do seu rosto com bastante precisão.
Mas, naquela noite, a minha mente não estava tão colaborante como de costume. As memórias não fluíam, e havia uma nuvem de fumo por entre todos os detalhes que tentava evocar.
O meu coração, desde há muito apertado, estava agora mais pequeno do que o costume.
Seth não me dava notícias há 3 dias. A minha caixa de e-mail estava vazia há dias. Não sabia nada de Forks nem dos Cullen... e este facto estava a deixar-me bastante preocupada.
E quando naquela tarde tomara a decisão de fazer uma chamada para os Estados Unidos (que me custaria uma fortuna) esperara seriamente que alguém me atendesse do lado de lá, dando-me boas notícias e descansando o meu pobre ser, mas, em vez disso a única coisa que ouvi foi um "Bip Bip" estridente e irritante.
"Anda lá mentezinha brilhante, traz-me o Seth, traz!", pedi.
A minha mente bloqueou naquele momento e caí num sono profundo e sem sonhos.
***
Abri os olhos abruptamente, esperando que o despertador da mesinha de cabeceira mascasse no máximo as 5 da manhã.
Soltei um grito desesperado quando vi um 8 brilhante e maldoso piscar.
- Bolas – praguejei ao levantar-me – ainda ensonada acabei por escorregar nos papéis que haviam caído, inevitavelmente, da minha mão, durante a madrugada.
"Facto número 1: Estava atrasada. Facto número 2: Ia perder o autocarro. Facto número 3: Tinha de correr! ", enumerou rapidamente a minha mente.
Respirei fundo, abri a janela – Kelly já não estava em casa, e vesti-me rapidamente.
Saí de casa, agarrando numa maça e correndo para a paragem do autocarro.
Depois de uma espera não muito demorada, acabei apertadinha dentro do veículo, rumo à universidade.
- Bem, estávamos a ver que te tinhas perdido! – disse-me Laura quando cheguei. – Íamos já ligar o 991!
- Hum? 991? – perguntei confusa, pestanejando.
- América! Não são de lá os teus lobos e vampiros? – riu Júlia. – Não foi lá que te perdeste?
Todas riram.
Tentei sem sucesso encontrar piada no comentário. Tudo o que menos precisava era que me relembrassem da minha obsessão pela Saga...
Tentei esboçar um sorriso. Tudo o que consegui foi uma careta amarga.
- O que estão a fazer aqui fora? – perguntei.
- O professor está em reunião. Só chega mais tarde. – explicou Laura. – Ainda bem que te atrasas-te!
- Podias ter avisado – ralhei em tom de brincadeira.
Laura tentou dar-me uma palmada no braço. Com uma destreza notavelmente inexistente, desvie-me de modo desengonçado.
- Ah! – Laura soltou um grito de surpresa.
Ri com vontade, projectando a cabeça para trás.
Quando me recompus, os meus olhos cruzaram-se com os dele.
Uma onda gelada atingiu o meu corpo. Todas as minhas extremidades nervosas estavam em alerta.
Ele estava ali, não tinha desistido. Os seus olhos, que um dia me pareceram amistosos e apaixonados, eram agora mais assustadores do que nunca.
- Olá – li-lhe nos lábios, que se abriam num sorriso traiçoeiro e ameaçador.
O meu instinto de sobrevivência gritava que fugisse. Que corresse para casa, me trancasse no roupeiro, e ali permanecesse até ao final dos meus dias.
Mas, de que adiantaria? Ele conseguiria, facilmente, chegar até mim. Bastava querer. E ele queria.
- Conheces? – perguntou Madalena, seguindo o meu olhar.
- Oh! – exclamou Rita – É o Rui! Afinal sempre existe, e não é só fruto da nossa imaginação!
- Já não tens de fazer o trabalho sozinha! – felicitou-me Madalena.
Rui. Rui. Rui Rui. O nome ecoava pela minha cabeça.
"Para meu belo prazer, o meu par era Rui: o aluno fantasma. Rui era uns indivíduos estranhos, que só tínhamos tido o prazer de vislumbrar uma ou duas vezes. Era uma espécie de mito do nosso curso. Ninguém sabia do paradeiro de tal ser..." pensara eu semanas atrás.
Foi então que as várias pontas soltas da história da minha mais recente forma de vida se juntaram.
Ellen poderia correr perigo.
"Mas, não é para a Ellen que ele está a olhar neste momento, pois não?" questionou o meu pensamento.